Disputa foi levada para o segundo turno após Noboa terminar quase empatado com Luisa González; observadores internacionais descartam fraude
O presidente do Equador, Daniel Noboa, denunciou nesta terça-feira supostas “irregularidades” na apuração dos votos do primeiro turno da eleição presidencial, que terminou com um empate técnico entre ele e a opositora de esquerda Luisa González. Embora Noboa liderasse em algumas pesquisas, a sua vantagem sobre a advogada no pleito foi de apenas meio ponto percentual, uma diferença de 40 mil votos. Ambos disputarão o segundo turno em 13 de abril. Em resposta, González reagiu à declaração cobrando “respeito aos equatorianos”.
— Houve muitas irregularidades e continuávamos contando. Seguíamos revisando em certas províncias que havia coisas que não batiam ou, inclusive, não batiam com a contagem rápida da OEA [Organização dos Estados Americanos], que nos colocava com um número maior — disse o presidente, de 37 anos, em entrevista à Rádio Centro de Guayaquil.
Noboa ainda acusou, sem apresentar provas, que o bom resultado do partido de González, o movimento Revolução Cidadã (RC), seria fruto de um suposto vínculo com a facção Los Lobos, uma das mais perigosas do país.
— Neste mesmo fim de semana, nós capturamos um membro de Los Lobos que têm direta relação com membros da Revolução Cidadã — afirmou Noboa. — Há dezenas e dezenas de casos em que ameaçaram as pessoas para que votassem na Revolução Cidadã. Temos provas (…). Os eleitores recebiam ameaças de grupos armados para que votem na candidata que os representa.
Oposição reage
González respondeu Noboa em uma publicação no X exigindo, entre outras coisas, que o presidente respeite os eleitores do país e “responda pelos bens e recursos do Estado usados na campanha”, afirmando que “crimes graves [foram] cometidos”.
“Exijo que respeite os equatorianos e as equatorianas, pátria que você não sente na sua alma porque nem o nosso hino nacional sabe”, escreveu a ex-deputada como o primeiro de “cinco pontos” destacados na publicação. No texto, González, apadrinhada política do ex-presidente socialista Rafael Correa (2007-2017), ainda foi taxativa ao dizer que “os eleitores da Revolução Cidadã não são traficantes nem bandidos”.
No entanto, durante a contagem na segunda-feira, González também denunciou “anomalias” na apuração e expressou sua desconfiança na autoridade eleitoral. Segundo ela, a polícia teria impedido alguns de seus observadores de entrarem nas seções onde ocorria a contagem dos votos.
— Muito provavelmente, a Revolução Cidadã está em primeiro — disse ela em entrevista ao Teleamazonas antes do fim da contagem.
UE e OEA rejeitam denúncias
Tanto as missões de observação da União Europeia (UE) quanto da Organização dos Estados Americanos (OEA) descartaram a possibilidade de fraude.
Pouco depois da entrevista de Noboa, os observadores da União Europeia (UE) afirmaram, em uma coletiva de imprensa em Quito, não ter “nem um único elemento objetivo que indique que houve qualquer tipo de fraude”. A OEA, por sua vez, indicou em um comunicado que sua “contagem rápida” coincide com os resultados da autoridade eleitoral e que “não identificou nem recebeu indícios de irregularidades”.
— Não observamos nenhum elemento objetivo para apoiar essa narrativa — reagiu Gabriel Mato, chefe da missão da UE. — Lamento que, além da desinformação, tenha sido acrescentada uma certa narrativa de fraude. Uma narrativa que, em determinado momento, foi liderada pela candidata presidencial do RC e seu partido e que, nesta manhã, também está sendo liderada pelo próprio Daniel Noboa. Posso dizer que não observamos nenhum elemento objetivo para apoiar essa acusação ou essa narrativa.
Durante a campanha, Noboa e González alimentaram suspeitas sobre possíveis fraudes nas eleições.
No entanto, a missão de observação da UE descreveu as eleições como “transparentes, bem organizadas e pacíficas”, apesar da atmosfera tensa no país.
— Entramos na campanha, nesse processo, com incertezas, com riscos, com inseguranças, com acusações de todo tipo, com uma certa desconfiança nos órgãos eleitorais e judiciais e em um cenário realmente complexo e muito polarizado e também com um clima de violência no ar — disse Mato.
Polarização
Os resultados apertados foram um golpe para Noboa, que havia dito que venceria no primeiro turno. Embora a maioria das pesquisas já previsse um segundo turno, um empate tão acirrado foi inesperado. Para ganhar a presidência no primeiro turno, seria preciso obter mais de 50% dos votos ou 40% e uma diferença de 10 pontos sobre o adversário mais próximo.
A polarização e as denúncias de fraude agora obscurecem a reta final da escolha do futuro presidente, com os equatorianos voltando às urnas com uma nova gama de preocupações. Para o cientista político Santiago Cahuasquí, a feroz guerra às drogas e a instalidade econômica levaram a “um nível extremo” de polarização no país, que enfrenta a sua pior crise em 50 anos.
— Em nosso país, vemos há anos como sequestraram a nossa democracia. Não confio nos resultados, ainda mais que houve um empate técnico — disse à AFP Angela Almeida, uma aposentada de 68 anos, em Quito.
No poder desde 2023, o presidente busca a reeleição com um plano de assumir uma posição firme contra as gangues que atuam no Equador — que foi de um dos mais seguros da América Latina para uma taxa de 47 homicídios por 100 mil habitantes, a mais alta da região. Após 14 meses de governo Noboa, o número caiu para 38 por 100 mil, segundo informações oficiais. Mas a sensação de insegurança ainda é presente no país, que no ano ado viu criminosos invadirem uma emissora ao vivo e fazer jornalistas de reféns.
Sua rival, González, busca devolver o poder à esquerda para enfrentar a insegurança e a crise com uma abordagem social. Ela também pretende se tornar a primeira mulher eleita presidente do Equador, aos 47 anos.
No segundo turno, os candidatos repetirão o duelo das eleições de 2023, nas quais Noboa se tornou um dos presidentes mais jovens do mundo, aos 36 anos. Na época, Noboa foi eleito para cumprir um mandato de apenas 16 meses, contemplando o tempo de governo que restava ao ex-presidente Guillermo Lasso depois que ele acionou o recurso conhecido como “morte cruzada”‘ para evitar um processo de impeachment por corrupção. A manobra dissolveu o Congresso e levou à sua substituição no cargo por outro presidente eleito.
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